Em
uma noite de sábado,
sentado em uma praça
pública, observava o
movimento. Gente rindo, conversando... Gente em grupo, casais e alguns
sozinhos. Idosos, adultos, jovens e crianças. Essas últimas, como desbravadoras do mundo, nunca paradas e
sempre em busca de um lugar inédito.
Risadas infantis acompanhadas de advertências maternas ou paternas de que não deveriam estar
correndo ocorriam com frequência,
gerando a mesma resposta: mais corrida e mais aventura.
Observar
crianças me faz sempre esboçar sorrisos tímidos. Daqueles que
ficam no canto da boca e que te fazem abaixar a cabeça para que não se percebam. São dissimulados e contentam-se
em só dar o ar da graça. Meu olhar vagueia, de
gentes em gentes, até
uma pequena menina reter toda a atenção do meu olhar. Cabelos cacheados,
cheios, vestido rosa com babados detalhando a peça em branco. Ela corre, em linha reta, ainda pouco
equilibrada. A sua frente uma pequena elevação no terreno a faz parar e voltar para trás. Ela cai, e
resolutamente, levanta e torna a correr em direção a elevação. Outro tombo, outra tentativa sem sucesso.
Ela ri, se senta no chão,
se levanta e toma embalo novamente. Começa a pender para trás no meio da elevação, como nas outras tentativas, mas firma
seus pequenos pés
no solo e põe
toda a sua força,
num ato heroico, para a frente. Ela vence a elevação e dá uma gargalhada de satisfação, de encher o ar.
Me
pego com aquele sorriso que já
descrevi anteriormente. Porém,
olhando para aquilo tudo, fiquei refletindo uma determinada coisa. A elevação que era o desafio da
pequena menina de cabelos cacheados não significaria nada para mim. Talvez nem notaria
aquela diferença
de relevo a não
ser com um tropeço.
Para menina, todavia, aquela elevação devia ser um enorme morro (e, por
favor, me permitam o bairrismo. Sou de Minas Gerais e mineiro entende bem de
morro, de serra e de subida. Na geografia e na vida). Sozinha, ela enfrentou o
desafio de ganhar a subida: era a menina contra o morro, o seu morro.
Ouvi
certa vez alguém
dizer que precisamos de gentileza na vida porquê nunca sabemos o que nosso semelhante tem passado,
quais lutas tem enfrentado. Olhar para menina refrescou isso na minha memória. Julgamos o morro do
outro sempre tendo em conta os morros que enfrentamos, numa egoística atitude de
acharmos que nossas dores são
as maiores dores do mundo. Elas podem ser, mas para nós. Não se justifica dor
comparando-se: deveríamos
nos compadecer das dores alheiras. Aliás, o contato empático com a dor do outro me ajuda, de alguma forma, a
entender melhor a minha dor. Qualquer elevação besta e cotidiana para mim pode ser um
morro para outra pessoa que a está enfrentando. Empatia nunca fez
mal na vida.
Mas,
não foi só a épica luta da menina
contra o morro que me chamou a atenção. Foi a gargalhada. Não sei em que medida, mas
perdemos de pouco a pouco a capacidade de gargalhar, de rir folgadamente. De
celebrar, verdadeiramente, nossas vitórias. Numa pressa que nos leva para lugar nenhum, até nossas vitórias se tornam itens a
serem ticados numa lista: após
a vitória, que venha a próxima luta. Não há tempo para regozijar,
para olhar o nosso morro vencido de cima e gargalhar, emocionar-se pela vitória.
Benditas
são as crianças, diria Cristo. E eu,
se puder humildemente acrescentar diria, bendito aqueles que nunca deixam de
ser. Que guardam em si essa potência
e essa vontade de sinceramente gargalhar, mesmo que enfrentando os seus morros.
Excelente reflexão!
ResponderExcluirOlá Pri de Luz!
ResponderExcluirObrigado pelo comentário. É gratificante para quem escreve ter essa atenção do comentário.
Continue com a gente,
forte abraço,
Jonathan Oliveira
Sei como é, Jonathan.
ResponderExcluirConhece meu trabalho de escritora?
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