Tenha
amigos que sejam um pé-de-cabra
na sua vida. Sou desses que, tal como uma ostra, tende a sempre a querer
fechar-se. Seja por medo, por uma falsa sensação
de segurança que chamamos de comodismo, minha concha sempre quer
se fechar. Naturalmente, em ritmos mais acelerados ou lentos, a concha volta a
sua posição anterior: fechada, protegida, confortável
e… feliz?
Eles,
melhor do que eu, sabem que o que temo é
a dor. É o desconhecido que no exterior cresce e assombra e
que, inevitavelmente, machuca. Aquele pequeno grão
de areia, sólido e pontiagudo, não
demora a encontrar o vão e sinto, no fundo da
minha dorsal, a lacerante dor. Mas que amigos são
estes que não me guardam de sofrer?
Eles
são os melhores.
Justamente
por eles também sofrerem, por conhecerem o movimento da minha
concha na experiência de concha deles. Ou
de pássaro sem asas, ou de peixe sem mar… Meus amigos são
ricos em metáforas. E, confessam, eu já
fui o pé-de-cabra deles. E, quase num imperativo ético
de nossa amizade, eles não podem permitir que me
feche e não podem evitar a minha dor. Meu incômodo,
minhas dúvidas, minhas incertezas. Deixem-me fechar! Não
quero sentir essa dor.
Mas,
enquanto forço ainda na vã
esperança de conseguir diminuir o sofrer, eles solicitamente
saem. Não há mais força
para fechar a concha… A dor, que aqueles benditos passaram comigo, agora parece
estar produzindo alguma coisa: não
uma das melhores pérolas, mas a minha pérola.
Eles foram pacientes, lutaram contra a força
do fechar e do sofrer para que ambos me possibilitassem produzir.
Não
tenho outra forma de lhes agradecer a não
ser lhes dizendo: procurem amigos que lhes sejam pés-de-cabra.
Sem eles, as coisas poderiam ser menos dolorosas, mais confortáveis.
Mas, lhes garanto: não seriam tão
maravilhosamente belas.
Nota: este texto é
dedicado a Teissi e Márcio.
Gostei do texto!! Pés de cabra fazem mesmo muita diferença!
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